sábado, 6 de abril de 2019

O lugar do DJ Rennan é na gaiola

Indo além do surto de achismo sobre o envolvimento do DJ com o crime, vamos aos fatos

DJ Rennan da Penha é referência na nova geração do funk carioca REPRODUÇÃO / FACEBOOK
POR GIAMPAOLO MORGADO BRAGA

O papo hoje é reto. Na internet, tem gente defendendo e gente jogando pedra em Renan Santos da Silva, o DJ Rennan da Penha, criador do Baile da Gaiola. Acha-se de tudo, o que é direito de qualquer um. A opinião é livre. Indo além do surto de achismo, vamos aos fatos.

Renan está condenado em segunda instância, pelo Tribunal de Justiça do Rio, a seis anos e oito meses de prisão por associação para o tráfico. Renan tem um mandado de prisão expedido contra ele e, até o momento em que escrevo este texto, ainda não foi preso nem se entregou. Renan aparece em vídeos feitos pela polícia beijando um traficante armado; no mesmo conjunto de imagens, seu Baile da Gaiola é a festa do fuzil, do bico par o alto, com traficantes em profusão armados com o que há de melhor no mercado negro.

Há argumentos de que a condenação de Renan é uma perseguição ao funk. Renan é o funk? Se ele fosse morto, vaporizado, neutralizado, o funk acabaria? Da mesma maneira que Mozart não era a música clássica, Elvis não era o rock e Caetano não é a MPB, Renan não representa o estilo musical que alavancou ao criar o Baile da Gaiola e divulgar outros artistas. Movimento musical não tem dono.

Esses argumentos, aliás, escondem uma versão jurídico-penal do “sabe com quem está falando?”. Como Renan é querido pelos seus pares, amado por parte da classe artística, então a ele são permitidas algumas transgressões: um salve aqui, uma mensagenzinha avisando sobre a subida do caveirão ali… Afinal, o que é uma ajudinha ao tráfico de drogas, que mata, mutila e destrói vidas, diante da contribuição tão relevante que deu à música acelerando o metrônomo?

Outro argumento é que Renan está sendo alvo de perseguição porque é negro. Errado. Renan ganhou de presente um mandado de prisão porque cometeu um crime. Logo, é um criminoso. Misturar isso com a cor da pele é ofender os negros honestos, que nunca precisaram nem precisarão bater cabeça para bandido. Além de ser uma argumentação pobre e pusilânime.

Há, por fim, quem diga que na favela é assim mesmo, o tráfico manda e Renan precisa se relacionar com os bandidos para fazer seu baile. Bom, para começar Renan não precisa fazer seu baile. Ou não precisar fazer seu baile ali. Ele não foi pego em casa, arrastado sob mira de arma até o palco e coagido a assumir as carrapetas.

Segundo, alegar que na favela é assim mesmo é um dos argumentos mais canalhas e covardes que já ouvi. Na favela não é assim mesmo. Dizer isso é dizer que estupradores podem estuprar, já que são tarados, e tarados são assim mesmo. Ou que pistoleiros têm de assassinar porque, diabos, é a profissão do sujeito — se ele não matar, vai fazer o quê? Na favela, a maioria das pessoas é honesta, não se mete com o crime, não se mistura com os bandidos. Se os moradores desses locais são subjugados pelos traficantes, então são vítimas e como tal devem ser tratados. Renan, pelo crime ao qual respondeu e foi condenado (“Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 desta Lei”), não é vítima de nada. É cúmplice. Afinal, como dizia a minha avozinha, quem com porcos anda, farelo come.

Fonte: Revista Época

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